Introdução: Mateus 14:24-27
Não sei a hora, nem o dia nem o ano, talvez 1993. Cheguei ao aeroporto de Luanda vindo de S. Tomé e Príncipe. Eram 2 horas da manhã, estava previsto chegar às 11 horas. Enquanto esperava receber a mala de bagagem olhava para a multidão para ver uma mão acenar. Como a dizer está tranquilo apesar da hora tardia estamos aqui à tua espera. Não vi nenhuma mão!
Recebi a mala e já a multidão em grande parte tinha desaparecido depois de receberem os seus amigos ou familiares. Eu continuava a olhar e não via ninguém. À porta olho para um lado e para o outro, ninguém. Nem um táxi. Em poucos minutos as únicas almas que por ali andam são militares de metralhadoras na mão de vigilância ao Aeroporto.
O meu olhar baixa para a terra, instantes para o céu e não vislumbro modo de sair dali. Pronuncio uma breve e incrédula oração aproxima-se um carro e pego apressadamente nas minhas malas (a da roupa e a de mão com o material para realizar seminários e conferencias) e logo me aproximo do carro e suplico ao condutor que me leve ao hotel Turismo. Lá fomos.
Não tinha reserva, fomos para um outro onde raramente ficava e também não tinha reserva. O meu condutor começava a dar sinais de impaciência e a negra noite da minha mente tornava-se mais escura que o escuro da noite. Não conseguia indicar o caminho da igreja adventista em Luanda e deambulávamos de um lado para o outro e o meu olhar perdia-se no nada.
Na nossa frente, numa rua de um bairro qualquer aparecem ao longe os faróis de um carro, passam das três horas da manhã e o meu condutor diz: “Tem que sair, são militares e se me apanham levam-se o carro.” Mais que rápido tenho as minhas malas no chão e ele desapareceu na noite. Tenho agora por companhia 5 militares sorridentes e irónicos, perguntam o que é que eu faço ali. Se até ali eu não sabia para onde olhar, não demorei muito a saber para onde devia de olhar. Nem para baixo, nem para o lado. Os meus olhos fixaram-se numa pequena casa e a minha fé em Jesus. Respondi com uma voz vinda não bem de onde: “Esta é a casa de um amigo meu, eu sou Pastor Adventista e ele está à minha espera, ele também é meu colega no ministério de Jesus.” Respondi: “Ai é, então, vai lá ter com ele” disseram, encostando-me os canos das metralhadoras à cabeça e acrescentando: “Branco se estás a mentir Jesus não gosta e morres”, riram-se e eu fui subindo a escada exterior e bati à porta, abre-se e é o Pastor Albino Vieira angolano que deveria estar no Aeroporto à minha espera.
Aprendi de uma vez por todas a olhar na turbulência da noite e dos perigos. Lembrei-me que Pedro também aprendeu a mesma lição da maneira mais difícil. Troquemos o carro por um barco pesqueiro de nove metros, no mar da Galileia, e os paralelos entre as nossas histórias começam a evidenciar-se. “O barco encontrava-se já a várias centenas de metros da terra, açoitado pelas ondas, pois o vento era contrário.” (Mat. 14:24).
No que concerne a lagos famosos, o da Galileia é pequeno e inconstante. O seu tamanho torna-o mais vulnerável aos ventos que sopram dos montes Golã. Estes transformaram o lago numa verdadeira batedeira, alterando subitamente, soprando primeiro numa direcção e em seguida, noutra. Os meses de Inverno provocam tremendas tempestades a cada duas semanas, revolvendo as águas durante dois ou três dias de cada vez.
Pedro e os seus companheiros de tormenta sabiam que estavam em apuros. O que deveria ter sido um cruzeiro de sessenta minutos tornou-se uma batalha que duraria toda a noite. O barco bordejou e arremeteu como um papagaio de papel sob os ventos de Março.
A luz do Sol era uma memória distante. A chuva caía do céu nocturno em bátegas. Os relâmpagos cortavam a escuridão como uma espada de prata. Os ventos fustigavam as velas, deixando os discípulos no meio do mar. “Açoitado (s) pelas ondas”. Uma descrição adequada, talvez, do estado em que se encontra a sua vida? E a minha naquela noite? Talvez apenas seja necessário alterar um substantivo ou outro…
No meio de um divórcio, açoitado pela culpa,
No meio da vida, sem um trabalho prometedor.
No meio de dívidas, açoitado por credores.
No meio de uma recessão, açoitado por pacotes de estímulos e promessas de recuperação.
No meio da doença ou da velhice, sem saber o futuro.
Os discípulos combateram a tempestade durante nove frias e encharcadas horas. E, por volta das 4 da manhã, o impronunciável aconteceu. Viram alguém a caminhar sobre as águas. “É um fantasma!” E gritaram com medo” (v.26).
Não esperavam que Deus fosse ter com eles daquela forma
Nem nós. Nem eu. Esperamos que venha em forma de hinos pacíficos ou numa reunião calma de oração, eventualmente num retiro espiritual. Ou ainda numa semana de reavivamento espiritual. Esperamos encontrar Jesus nas devoções matinais, nas ceias da igreja e na meditação. Mas é durante as tempestades que Ele melhor se mostra, pois é então que tem a nossa maior atenção.
Jesus respondeu ao medo dos discípulos com um convite digno de ser inscrito nas pedras fundamentais de todas as igrejas e nos arcos de todas as casas: “Tranquilizai-vos”, disse Ele, “estou aqui, não temais” (v. 27).
Estas palavras são poderosas. Acordar num quarto de hospital e ouvir o nosso marido dizer: “Estou aqui.” Perder a reforma e no entanto sentir o apoio da família nas palavras: “Estamos aqui”. Quando um pequeno menino brinca e corre atrás de uma bola e de um momento para outro lembra-se do pai, ou da mãe, olha em todas as direcções quando os olhos encontram os pais a assistir à sua brincadeira, “Estou aqui” muda tudo. Talvez seja por isso que Deus repete a garantia “Estou aqui” tantas vezes:
Fil.4.5 “Perto está o Senhor”
João 14:20 “E vós em mim, e Eu em vós” João 14:20
Mateus 28:20 “E sabei que Eu estarei sempre convosco até ao fim dos tempos”
João 10:28 “dou-lhes a vida eterna, e nem elas hão-de perecer jamais, nem ninguém as arrancará da minha mão.
Rom. 8:38 “Porque estou certo de que, nem a morte, nem a vida, nem os anjos, nem os principados, nem as potestades, nem o presente, nem o porvir,
39 Nem a altura, nem a profundidade, nem alguma outra criatura nos poderá separar do amor de Deus, que está em Cristo Jesus nosso Senhor.”
Não podemos ir onde Deus não esteja. Olhe para trás de si; aí está Deus a segui-lo. Olhe para a tempestade; aí vem Cristo na sua direcção.
“Louvado seja Deus! Quando vejo o que Deus tem executado, encho-me de admiração e de confiança na liderança de Cristo. Nada tem que recear quanto ao futuro, a menos que esqueçamos a maneira em que o Senhor nos tem guiado, e os ensinos que nos ministrou no passado.”
Mensagens Escolhidas, vol. 3, p. 162
Pedro nunca teria feito este pedido perante um mar calmo. Se Cristo tivesse avançado por cima de um lago espelhado, pedro teria aplaudido, mas duvido que tivesse saído do barco. As tempestades impelem-nos a viagens sem precedentes. Com alguns passos históricos e durante alguns momentos impressionantes, Pedro fez o impossível. Desafiou todas as leis da gravidade e da natureza; “descendo do barco, andou sobre as águas, para ir ter com Jesus”.
Seguramente, todos nós gostaríamos de saber quanto tempo demorou Pedro a sair do barco?
O que estavam a fazer os outros discípulos?
Que expressão tinha o seu rosto? E assim por diante.
Mateus não tinha tempo para questões deste género. Leva-nos rapidamente para a mensagem mais importante deste acontecimento: para onde dirigir o olhar durante uma tempestade. “Mas, sentindo a violência do vento, teve medo e, começando a ir ao fundo, gritou: “Salva-me, Senhor!” (v. 30).
Ellen White diz: ele olhou para trás para os seus companheiros e quando procurou o Mestre o nevoeiro e as ondas levaram-no a olhar para todo o lado, mas não encontrar o Senhor.
Uma parede de água toldou-lhe a visão. Um relâmpago iluminou o lago. Um momento de orgulho fez com que se esquecesse da direcção a seguir. Pedro afundou-se como um tijolo num charco. Se dermos mais atenção às águas da tempestade do que ao Caminhante das Tempestades, preparemo-nos, pois o mesmo nos acontecerá.
Não podemos escolher se as tempestades virão ou não. Mas podemos decidir para onde olhar durante uma tempestade.
Quando era criança não gostava que a professora me dissesse: José Carlos, espera que todos saiam preciso falar contigo.
Não gostava quando a minha mãe dizia que tínhamos que ir ao médico por causa do meu ouvido. Mas ia e sentava-me a olhar os diplomas que ele tinha pendurados na parede. Um era da universidade de Coimbra, outro de um estágio. E assim continuava.
Quanto mais contemplava os seus feitos melhor me sentia. E ainda por cima ele era primo da minha mãe. Quando ele me enfiava umas espátulas na garganta e uns pequenos aparelhos nos ouvidos e dizia à minha mãe que o “caso era sério”, não sei bem porquê, sentia-a um certo conforto, sim, eu estava doente e precisava de cuidados especiais.
O grande problema era quando a minha mãe me colocava umas gotas que me queimavam os ouvidos e eu gritava por todo o socorro, sentia o meu mar da Galileia.
O que acontecia à minha confiança? Sentia-me muito melhor instantes antes. Por isso, mudei de estratégia. Sempre que ia ao consultório, olhava para as paredes em busca de sinais de boas notícias. É isso que Deus quer que façamos.
Não devemos ser alheios aos desafios avassaladores que a vida acarreta. Devemos contrabalançá-los com olhares prolongados para as obras de Deus. “Por isso, é necessário prestarmos maior atenção ao que ouvimos, para que não nos transviemos” Heb. 2:1.
Faça o que for preciso para não desviar os olhos de Jesus.
• Lembro-me muitas vezes da irmã França, ela estava numa casa de repouso com esclerose múltipla, o marido estava no mesmo quarto, ele tinha aprendido a ser crente ao contemplar a fé da esposa. Ele contava-me que quando estava cansado, ia à casa de banho e cantava as estrofes do hino “Olha com fé para cima” nº 272.
Alimente os seus medos, e a sua fé morrerá à fome.
Alimente a sua fé, e será o medo a morrer.
Jeremias fê-lo. Ele, sim, foi alguém apanhado numa tempestade! “Eu sou o homem que conheceu a miséria, sob a vara da sua ira. Conduziu-me e fez-me caminhar nas trevas e não na luz. Dirige contra mim a sua mão todos os dias, sem cessar” Lam. 3:1-3.
Jeremias estava deprimido, tão pesaroso. Jerusalém estava cercada e a sua nação submetida a uma grande provação. O seu mundo ruiu como um castelo de areia sob um tufão. Culpou Deus por aquela terrível perturbação emocional. Também culpou Deus pelos seus males físicos. “Consumiu a minha carne e a mina pele, partiu os meus ossos” (v.4).
Doía-lhe o corpo. Tinha o coração doente. A sua fé fraquejava. “Deus edificou e levantou um cerco de dores e amargura em meu redor” (v.5)
Jeremias sentia-se encurralado como um homem num beco. (vv. 7-9).
Jeremias era capaz de nos dizer a altura das ondas e a velocidade do vento. Mas depois apercebeu-se de quão depressa se afundava. Por isso, alterou a direcção do seu olhar. Ler : vv. 21-24.
“O Senhor é a minha herança”, disse a minha alma. Por isso espero nele.
1. A misericórdia do Senhor não acaba.
2. Não se esgota a Sua compaixão.
3. Cada manhã se renova.
4. Grande é a Sua fidelidade.
5. O Senhor é a minha herança.
A tempestade não cessou, mas o seu desespero sim. Tal como o de Pedro. Passados alguns minutos de sofrimento na água, voltou-se de novo para Cristo e gritou: “Salva-me, Senhor!” Imediatamente Jesus estendeu-lhe a mão, segurou-o e disse-lhe: “Homem de pouca fé, porque duvidaste?” E, quando entraram no barco, o vento amainou” Mat. 14:30-32.
Jesus podia ter travado aquela tempestade hora antes. Mas não o fez. Queria ensinar uma lição aos Seus seguidores. De igual modo, Jesus poderia ter apaziguado a sua tempestade há muito. Mas não o fez. Será também quer ensinar-lhe uma lição? E poderá essa lição se algo como: “As tempestades não são opcionais, mas o medo, sim”?
Deus tem os Seus diplomas expostos no universo. Arco-íris, pores-do sol, horizontes e céus estrelados. Registou os Seus feitos nas Escrituras. O Seu currículo inclui abrir o Mar Vermelho. Fechar a boca de leões. Derrubar Golias. Ressuscitar Lázaro. Parar tempestades e caminhar sobre as águas.
A Sua lição é clara. Ele é o Comandante de todas as tempestades. Também da sua, fixe o olhar n´Ele. Este pode ser a sua primeira ida ao consultório. Mas certamente não é o d´Ele.
Ele está a dizer: Estou aqui.
Pr. José Carlos Costa
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