sexta-feira, 9 de novembro de 2012

POSTOS DE COMBATE

(Filipenses 1:27-30)

A vida cristã não é um campo de recreio; é um campo de batalha. Nós somos filhos da família, gozando, portanto, da comunhão do evangelho (1:1-11); somos servos que participam no avanço do evangelho (1:12-26); mas somos igualmente soldados que defendem a do evangelho. E o crente com uma fonte convertida pode ter a alegria do Espírito Santo, mesmo no meio da batalha.

“A fé do evangelho” é esse corpo de verdade divina dado à igreja. Judas chama-lhe “a fé que uma vez foi dada aos santos” (v.3). Paulo alerta-nos em 1 Timóteo 4:1 para o facto de que “nos últimos tempos apostatarão alguns da fé”. Deus entregou este tesouro espiritual a Paulo (1 Tim. 1:11), e ele por sua vez entregou-o a outros, como Timóteo (1 Tim. 6:20), cuja responsabilidade consistia em transmitir esse depósito a outros (II Tim. 2:2). E por isso que a igreja se deve envolver num ministério de ensino de modo que cada nova geração de crentes conheça, aprecie e use a grande herança da fé.

Mas existe um inimigo que está em campo para roubar o tesouro do povo de Deus. Paulo tinha-se encontrado com esse adversário em Filipos e enfrentava-o de novo em Roma. Se Satanás conseguir simplesmente roubar aos crentes a fé cristã, as doutrinas que a distinguem de qualquer outra, então ele poderá perturbar e destruir o ministério do evangelho. É triste ouvir pessoas dizer: “Não me interessa o que tu creias, contanto que vivas de maneira correcta.” O que cremos determina a maneira como procedemos, e uma crença errada significa em última análise uma vida errada. Cada igreja local não está senão a uma geração duma extinção potencial. Não admira que Satanás ataque particularmente a nossa juventude, tentando afastá-la “da fé”.

Como é que um grupo de cristãos pode lutar contra este inimigo? “Porque as armas do nosso combate não são da carne” (II Cor. 10:4, NBPA). Pedro pegou numa espada, no jardim, e Jesus repreendeu-o (João 18:10-11). Nós usamos armas espirituais – a Palavra de Deus e a oração (Hebr. 4:12; Ef. 6:11-18); temos de depender do Espírito Santo para nos conceder o poder de que carecemos. Contudo, um exército tem de lutar em união e é por isso que Paulo envia estas admoestações aos seus amigos em Filipos. Ele explica neste parágrafo que existem três elementos essências para se conseguir a vitória na batalha para defender “a fé”.

1.      Coerência (1:27)

A palavra portar relaciona-se directamente com andar. “Somente deveis conduzir-vos de modo digno do evangelho de Cristo (NBPA). A arma mais importante contra o inimigo não é um sermão empolgante ou um livro poderoso; é a vida coerente dos crentes.

O verbo que Paulo usa está relacionado com a nossa palavra política. Ele está a afirmar: “Procedei da maneira como os cidadãos devem proceder”.

Quando cheguei à cidade do Porto, fiquei impressionado, ao caminhar nas ruas, ouvia homens e mulheres, mesmo, jovens meninas com uma linguagem muito feia. Eu não me recordava de alguma vez ouvir tantos palavrões, nem na tropa. Eu pensei estas pessoas estão a dar um mau exemplo do país, ainda bem que os estrageiros não sabem falar nem compreendem a língua portuguesa.

Paulo dá aqui a ideia de que nós, cristãos, somos cidadãos do céu e enquanto estamos na terra temos de nos comportar como cidadãos dos céus. Ele apresenta de novo este conceito no capítulo 3:20. Essa expressão era rica em significado para os filipenses, porque essa cidade era uma colónica romana e os seus cidadãos eram de facto cidadãos romanos, protegidos pela lei de Roma. A igreja de Jesus Cristo é uma colónia do céu na terra! E nós devemos portar-nos como cidadãos do céu.

“Estarei eu a comportar-me de modo digno do evangelho?” é uma boa pergunta para fazermos regularmente a nós próprios. Devemos “andar… como é digno da vocação” que temos em Cristo (Ef. 4:1), que significa andar “dignamente diante do Senhor, agradando-lhe em tudo” (Col. 1:10). Nós não fazemos isso com vista a ir para o céu, como se pudéssemos ser salvos pelas nossas boas obras, mas procedemos desse modo, porque os nossos nomes já estão escritos no céu e a nossa cidadania é no céu.

É bom lembrar que o mundo que nos rodeia conhece unicamente o evangelho que vê nas nossas vidas.

“Um Evangelho escreves,

Cada dia uma secção,

Com as obras que realizas

E qualquer exclamação,

Os homens lêem esse livro

Em todo o seu pormenor:

Como é, pois, o Evangelho

De que tu és o autor?”

(autor desconhecido)


“O Evangelho” é a boa nova de que Cristo morreu pelos nossos pecados, foi sepultado e ressuscitou (1 Cor. 15:1-8). Só há uma “boa nova” de salvação; qualquer outra mensagem é falsa (Gál. 6:10). A mensagem do evangelho é a boa nova de que os pecadores podem tornar-se filhos de Deus pela fé em Jesus Cristo, o Filho de Deus (João 3:16). Acrescentar alguma coisa ao evangelho é despi-lo do seu poder. Nós não somos salvos dos nossos pecados pela fé em Cristo mais alguma coisa; somos salvos pela fé em Cristo somente.

“Nós temos alguns vizinhos que acreditam num falso evangelho” – disse um membro duma igreja ao seu pastor. “Tem alguma literatura que eu lhes possa dar?”

O pastor abriu a sua Bíblia em II Coríntios 3:2 e leu: “Vós sois a nossa carta, escrita nos nossos corações, conhecida e lida por todos os homens”. Disse-lhe então: “A melhor literatura deste mundo não pode substituir a sua própria vida. Deixe-os ver Cristo na sua conduta e isso abrirá oportunidades de partilhar com eles o evangelho de Cristo.”

A maior arma contra o diabo é uma vida verdadeiramente piedosa. A igreja local que pratica a verdade, que “vive o que crê”, irá destruir o inimigo. Este é o primeiro elemento essencial para se conseguir a vitória nesta batalha.


2.      Cooperação (1:27b)

Paulo passa agora a usar a ilustração do atletismo. A palavra traduzida por “combatendo juntamente” dá-nos o termo “atletismo”. Paulo vê a igreja como uma equipa e recorda aos crentes que é o trabalho em equipa que ganha vitórias. Não nos esqueçamos de que havia divisão na igreja de Filipos. Um dos motivos era que havia duas mulheres que não estavam a dar-se bem (4:2). Aparentemente, os membros da comunidade tomavam partido, como acontece muitas vezes, e a divisão daí resultante estava a prejudicar o trabalho da igreja. O inimigo fica sempre feliz ao ver divisões internas no ministério local. “Dividir para conquistar” é o seu lema, e muitas vezes o consegue. É só combatendo juntos que os crentes podem vencer o inimigo.

Ao longo desta carta, Paulo usa um interessante esquema para salientar a importância da unidade. Na língua grega, o prefixo sun significa “com, juntamente”, e quando usado com diferentes palavras reforça a ideia de unidade. (É, de certo modo, semelhante ao nosso prefixo co. Paulo usa-o) pelo menos 16 vezes na epístola aos Filipenses e os seus leitores não podiam deixar de reparar nessa mensagem. Em 1:27, o termo grego sunathleo – “combatendo juntos como atletas”.

Uma ou outra vez, ouço um atleta brilhante seja no futebol, ciclismo ou outra qualquer modalidade dizer: “Foi graças aos meus colegas …” ele tem consciência que ele faz parte de uma equipa e é esta que trabalha para que um brilhe. É essa atitude que favorece a vitória ou a derrota no caso de cada um pensar no individual e não no colectivo. Infelizmente, temos também nas igrejas tais “caçadores de louros”. João teve de lidar com um indivíduo chamado Diótrefes, porque ele queria “ter entre eles o primado” (III João 9). Mesmo os apóstolos Tiago e João pediram que lhe fossem atribuídos tronos especiais (Mat. 20:20-28).

A palavra importante é juntos: permanecer firmemente juntos no Espírito, combatendo juntos contra o inimigo e fazendo isso com uma só mente e um só coração.

Não seria difícil propagar este conceito de igreja local como uma equipa de atletas. Cada pessoa tem o seu lugar e trabalho designado e se cada uma cumpre a sua tarefa, está a ajudar todos os outros.

Nem todos podem ser capitão de equipa ou outro elemento chave! A equipa tem de seguir as regras e a Palavra de Deus é o nosso “Livro de regulamentos! Há um alvo – honrar Cristo e a Sua vontade. Se todos trabalharmos juntos, podemos atingir esse alvo, ganhar o prémio e glorificar o Senhor. Mas no momento em que um de nós começa a desobedecer às regras, interrompendo o treino (a vida cristã requer disciplina), ou buscando glória pessoal, o trabalho de equipa desaparece e passam a imperar a divisão e a competição.

Por outras palavras. Paulo recorda-nos de novo a necessidade duma mente convertida. Há alegria nas nossas vidas, mesmo quando lutamos contra o inimigo, se vivermos para Cristo e para o evangelho e praticamos “trabalho cristão em equipa”. É certo que existem pessoas com as quais não podemos cooperar (II Cor. 6:14-18; Ef. 5:11); mas há muitas outras com quem o podemos fazer – e devemos fazê-lo!

Somos cidadãos do céu, portanto, devemos andar de modo coerente. Somos membros da mesma “equipa” e devemos trabalhar em cooperação. Mas existe um terceiro elemento essencial para termos êxito no nosso embate com o inimigo, e esse é a confiança.

3.      Confiança (1:28-30)

“Em nada vos espanteis dos que resistem!” A palavra que Paulo usa aqui aponta para um cavalo que foge da batalha. É claro que ninguém vai arremessar-se cegamente para a luta; mas por outro lado, nenhum crente verdadeiro deve deliberadamente evitar enfrentar o inimigo. Nestes versículos, Paulo dá-nos palavras de encorajamento para nos transmitir confiança na batalha.

Primeiro, essas lutas provam que somos salvos (v. 29). O contexto da salvação não é; salvo uma vez salvo para sempre, mas antes, “fui salvo, sou salvo, serei salvo”. Fui salvo quando aceitei a Jesus Cristo como meu Salvador pessoal, sou salvo, cada dia ao renovar o meu pacto de confiança n´Ele, serei salvo quando Ele vier em glória e majestade. É nesta relação crente, salvação e Cristo que o cristão de mente convertida sofre com Cristo. Paulo define isto como “a comunicação das suas aflições” (3:10). Por qualquer razão, muitos novos crentes têm a ideia de que confiar em Cristo significa o término das suas lutas. Na realidade, significa exactamente o começo de novas batalhas. “No mundo tereis aflições” (Joao 16:33). “E também todos os que piamente querem viver em Cristo Jesus padecerão perseguições” (II Tim. 3:12).

Mas a presença de conflito é um privilégio; sofremos “por amor dele”. De facto, Paulo diz-nos que este conflito nos é “concedido” – é um dom! Se sofrêssemos por nós mesmos, isso não constituiria nenhum privilégio; mas, porque sofremos por Cristo e com Cristo, é uma honra elevada e santa.

Afinal, Ele sofreu por nós e uma disposição da nossa parte para sofrer por Ele é o mínimo que poderemos fazer para Lhe demonstrar o nosso amor e gratidão.

Uma terceira expressão de encorajamento é esta: outros estão a experimentar o mesmo conflito (v. 30). Satanás quer que pensemos que nos encontramos sós na batalha, que as nossas dificuldades são únicas, mas não é esse o caso. O apóstolo Paulo lembra aos filipenses que ele próprio está a atravessar idênticas dificuldades às que eles experimentaram a centenas de quilómetros de Roma! Uma mudança geográfica não constitui geralmente solução para os problemas espirituais, porque a natureza humana é a mesma em qualquer lugar em que nos encontremos, e o inimigo aparece em toda a parte. O facto de se saber que outros crentes estão a tomar parte na mesma batalha dá-nos ânimo para prosseguirmos e orarmos por eles como por nós mesmos.

Na verdade, atravessar um conflito espiritual é uma das formas que temos para crescermos em Cristo. Deus dá-nos a força de que necessitamos para permanecermos firmes contra o inimigo, e esta confiança mostra-lhe que será ele o derrotado (ele já foi derrotado), pois nós estamos do lado da vitória (v. 28b). Os filipenses tinham visto o apóstolo a atravessar lutas aquando da sua presença com eles (ler Atos 16:19 e seguintes), e testemunharam da sua firmeza no Senhor.

A palavra “conflito” dá-nos a palavra agonia e é este o temos que se aplica para definir a luta de Cristo no jardim (Lucas 22:44). Quando enfrentamos o inimigo dependendo do Senhor, Ele dá-nos tudo o que é necessário para a batalha. Quando o adversário vê a nossa confiança, que nos foi dada por Deus, fica temeroso.

Assim, a mente convertida permite-nos sentir alegria no meio da batalha, porque produz em nós coerência, cooperação e confiança. Nós experimentamos a alegria do “trabalho espiritual em equipa” quando combatemos juntos pela fé do evangelho.

 

José Carlos Costa, pastor

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