domingo, 25 de abril de 2010

UM GRITO DE ANGÚSTIA

45 E, desde a hora sexta, houve trevas sobre toda a terra, até a hora nona.
46 Cerca da hora nona, bradou Jesus em alta voz, dizendo: Eli, Eli, lamá sabactani; isto é, Deus meu, Deus meu, por que me desamparaste?
Mateus 27:
Já alguma vez prestou atenção à serenidade com que Jesus orava?
“Depois de assim falar, Jesus, levantando os olhos ao céu, disse: Pai, é chegada a hora; glorifica a teu Filho, para que também o Filho te glorifique” João 17:1
“Pai, desejo que onde eu estou, estejam comigo também aqueles que me tens dado, para verem a minha glória, a qual me deste; pois que me amaste antes da fundação do mundo.” João 17:24.
“Cristo disse: Por isto o Pai me ama, porque dou a minha vida para a retomar.” João 10:17.
Mas, absorto nos Seus pensamentos, Jesus cruzou o ribeiro de Cedron, entrou no jardim do Getsémani (João 18:1) e as Suas súplicas mudaram de tom.
As orações de Cristo no Getsémani e no Calvário foram muito diferentes das Suas orações anteriores. Depois de dizer aos Seus discípulos “a minha alma está profundamente triste, até à morte”, prostrou-Se em terra (Marcos 14:34,35). Tão intensa era a Sua agonia, que orou: E dizia: “Aba, Pai, tudo te é possível; afasta de mim este cálice; todavia não seja o que eu quero, mas o que tu queres.” Marcos 14:36.

A palavra Abba revela a Sua relação profunda com Deus e o afecto que sentia por Ele. Em três ocasiões tinha sentido que a Sua missão era pesada (Marcos 14:34-41), mas em cada uma delas tinha-se rendido ao Pai dizendo: “Não seja como Eu quero, mas como Tu queres” Mateus 36,42,44.
Cristo veio à Terra para fazer a vontade do Seu Pai (ver Hebreus 10:5-7), mas a agonia do Getsémani fê-l´O tremer quando Se aproximava da meta. Um anjo desceu do Céu para O fortalecer mas “posto em agonia, orava mais intensamente. E o Seu suor tornou-se em grandes gotas de sangue, que corriam até ao chão” Lucas 22:44.

1. A intensidade da Sua dor.
Alguns dos Seus compatriotas tinham-n´O entregue aos romanos. Judas atraiçoara-O. Pedro tinha-O negado. Os Seus discípulos tinham-n´O abandonado precisamente quando mais necessitava deles. E Ele pôde suportar tudo aquilo, mas quando parecia que Deus também O tinha abandonado, o Seu coração ficou destroçado, e gritou com força: “Deus Meu, Deus Meu, porque Me desamparaste?” Mateus 27:46.
Aquele foi um grito de angústia, proferido com lábios trementes o coração despedaçado, enquanto estava suspenso na cruz. Aquele era o terrível preço da nossa redenção, um preço que nós nunca poderíamos pagar, nem sequer compreender, mesmo durante toda a eternidade.

A palavra “clamar” ou “gritar” (anaboao) só se utiliza aqui em todo o Novo Testamento. É um verbo forte que indica uma emoção poderosa e uma súplica a Deus. Sugere um grito de agonia resultante do profundo sentimento de alienação que Jesus experimentou como “resgate” pela humanidade (ver Mateus 20:28). Nos evangelhos sinópticos (Mateus, Marcos e Lucas), esta é a única ocasião em que Jesus se dirige a Deus sem Lhe chamar “Pai”.
Paulo diz que aqueles que receberam “o espírito de adopção de filhos” (hiothesias) exclamam (krazomen) “Abba, Pai” (Romanos 8:15; cf. Gálatas 4:6).

No entanto, mais ninguém poderia estar melhor qualificado do que o Filho de Deus para Se dirigir a Ele como “Abba”, o “Pai”. Abba é a palavra aramaica para fazer referência a Deus, é um termo carinhoso como “papá”. Nos evangelhos, Jesus, como Filho do homem, falou do Seu Pai e orou a Ele, e ensinou os Seus seguidores a orar, dizendo: “Pai nosso, que estás no Céu” (Mat. 6:9). Então, por que razão agora, na cruz, Cristo clama com força “Deus Meus”, em vez de “Abba” ou “Pai”?

Nada pode separar uma pessoa de Deus (Romanos 8:35-39) excepto o pecado (Isa. 59:2). Isto significa que Cristo sentiu uma separação no mais profundo da Sua alma, porque carregou os pecados de todo o mundo (1ª João 2:2). “O Senhor fez cair sobre Ele a iniquidade de nós todos” (Isa. 53:6). Como membro eterno da Trindade, Cristo sempre tinha estado rodeado pelo maravilhoso amor do Pai e do Espírito. Quão terrível era a Sua separação deles agora! A Sua solidão era intensa. Desde as alturas, o amor eterno tinha descido para salvar a humanidade, ainda que o preço que tivesse que pagar fosse muito alto, e sabendo que a maioria O rejeitaria. Não existe amor maior!

Cristo, no Seu corpo, “levou Ele mesmo os nossos pecados sobre o madeiro” (1ª Pedro 2:24). “Cristo nos resgatou da maldição da lei, fazendo-se maldição por nós; porque está escrito: Maldito todo aquele que for pendurado no madeiro.” (Gál. 3:13). Cristo sentiu-Se abandonado, separado do Pai, como se já não fosse Filho de Deus. A terrível carga do pecado, tão detestável para o PAI e para o Espírito, e tão horrenda para Cristo, acabou com a Sua vida. Essa carga de pecado separou Jesus da comunhão com o Pai e com o Espírito que Ele ansiava ter e de que necessitava tão desesperadamente.

O Calvário constituiu um juízo contra Satanás, o originador do pecado (Heb. 2:14), e contra o Salvador, como substituto dos pecadores (2ª Cor. 5:21; cf. Isa. 53:10,11). Cristo tomou o lugar de cada ser humano e sofreu o juízo divino pelos pecados de todos que gesto assombroso!

2. Abandono total.

Jesus homem chegou ao limite, precisamente onde mais necessitava de Deus. Mas justamente no momento da Sua maior necessidade, sentiu-Se abandonado por completo. É impossível compreender a inexprimível angústia dessa terrível solidão.

Deve ter causado uma tremenda dor ao Pai e ao Espírito ver Jesus sofrer e morrer como homem, pois Eles sentiram o Seu sofrimento. O grito de Cristo é a experiência mais dramática dos evangelhos. Embora antes tivesse falado da Sua ressurreição (Mat. 16:21) e da Sua segunda vinda (Mat. 16:27), durante aquelas terríveis horas sobre a cruz não podia vê-las através da escuridão. Temia que a “separação (de Deus e do Espírito) se tornasse eterna” (Desejado de Todas as Nações, p. 642). Cristo estava disposto a perecer para salvar a humanidade. E tê-lo-ia feito ainda que fosse só por si, amigo/a!
Cada membro da Trindade esteve envolvido no sofrimento na cruz. Para a Divindade foi um suplício ouvir o Varão de dores clamar: “Deus Meu, Deus Meu, porque Me desamparaste?” (Marcos 15:34). O “pagamento” da culpa humana implicava que Cristo assumisse o castigo por todos os pecados. Experimentou o abandono total de Deus que devíamos sofrer nós. Não havia outra maneira.

Não foi um Deus zangado que castigou a culpa humana, mas sim um Pai e um Espírito quebrantados que sofreram juntamente com Cristo, embora só Ele devesse ser o sacrifício pelo pecado. Ninguém jamais poderá compreender a profundidade do sofrimento partilhado pela Trindade durante as horas que Jesus esteve suspenso na cruz. Só podemos imaginá-lo nas palavras: “Porque Deus amou o mundo de tal maneira, que deu o Seu Filho unigénito” João 3:16.
3. Esperança por fim!
Toda a Trindade esteve presente na cruz. O Calvário abre as profundezas insondáveis do amor divino, de maneira que a rebelião não possa surgir de novo (ver Números 1:9). O amor revelado no Calvário atrairá e manterá para sempre todos os seres, tanto os não caídos como os salvos, perto de Deus, em adoração e louvor.

Pouco antes da Sua morte, com profunda fé, Cristo dirigiu-Se uma vez mais a Deus como Pai: “Pai, nas Tuas mãos entrego o Meu espírito” (Lucas 23:46). Maravilha das maravilhas: o indefeso Jesus humano, que possuía a plenitude da divindade, nunca dependeu da Sua própria divindade, mas agarrou-Se à divindade do Seu Pai, ainda que, como portador do pecado, Se sentisse abandonado por Deus.

Quem pode entender a profundidade do sacrifício que isto representou?
Quando olho para a cruz, clamo com força a Deus, para que quebrante o meu coração, e me leve a dar-me conta de que Jesus morreu pela minha transgressão da lei, pelo meu pecado e por minha culpa. Clamo com força para que possa amá-l´O de todo o coração, para que possa deleitar-me na Sua lei e odiar o pecado pelo que Lhe fez. O meu pecado crucificava novamente Cristo (Heb. 6:6).
Por isso oro: “Quebranta, ó Deus, o meu coração, para que eu não quebrante o Teu.”
Nós não poderemos viver como Ele viveu se não estivermos com Ele. Mas dado que Cristo sofreu a agonia de estar separado de Deus e experimentar essa sensação de abandono, Deus promete-nos: “Não te deixarei, nem te desampararei” (Heb. 13:5).
Cristo experimentou o abandono mais terrível para que nunca tenhamos que estar longe de Deus.
Que assombrosa substituição!

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